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Reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos com o poder público e a crise da Covid-19

Os nefastos efeitos da pandemia do Covid-19 são sem precedentes e ainda incalculáveis, inclusive quanto àqueles incidentes sobre as atividades do Poder Público e o trato de suas relações contratuais, com o risco de comprometimento, em consequência, de diversos setores empresariais que possuam linha de atuação econômica junto ao Estado, por meio de contratos públicos e concessões.

É por essa razão que já existe necessidade concreta de preservação do caixa dessas empresas, a exigir ações preventivas e due diligence, voltadas à mitigação de eventuais prejuízos resultantes da excepcionalidade da situação e de atos de império do Poder Público, que tenham por efeito interferências mediatas ou imediatas na execução dessas obrigações pelo parceiro privado.

Nesse contexto, vale registrar que o regime jurídico dos contratos administrativos regidos pela Lei n. 8.666/93 autoriza o poder contratante a promover, mediante justificativa, ainda que unilateralmente, alterações contratuais que busquem adequar o ajuste às circunstâncias imprevisíveis, ou mesmo proceder à suspensão de sua execução (arts. 65, II,”d” e 78, XIV, da Lei n. 8.666/93), desde que aquilatada, de modo razoável e cauteloso, sua real necessidade, por parte da Administração.

O possível aumento dos encargos da parte contratada, no entanto, impõe à Administração o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro inicial, por meio de aditamento ao contrato original (art. 65, § 6º, da Lei n. 8.666/93 e art. 81, VI, da Lei 13.303/16 – Lei das Estatais).

Sendo esse o caso, o eventual pedido extrajudicial de restabelecimento do equilíbrio do contrato não parece ser a providência mais adequada no momento, enquanto não superado o atual contexto emergencial. Isso porque deve-se ter presente, de um lado, a imprevisibilidade das próximas ações que se revelarão necessárias à contenção da pandemia, e, de outro, em razão da alocação prioritária, nesse momento, de recursos materiais e humanos do Poder Público para as áreas da saúde e de segurança sanitária.

Tal circunstância não impede, contudo – tornando-se necessário, na realidade – que o particular formalize documentalmente os impactos da álea econômica extraordinária e extracontratual, ou mesmo daqueles resultantes da alteração ou suspensão do contrato pelo Poder Público, sobre a demanda e sobre as condições materiais de se dar seguimento à execução das obrigações contratadas, tais como aqueles incidentes sobre o fluxo de caixa, aumento no preço e redução do fornecimento de insumos, desmobilização de parte do pessoal, variação abissal da moeda americana, dentre outros, para o adequado exercício do direito ao reequilíbrio econômico-financeiro pelo parceiro privado.

A mesma orientação deve ser aplicada aos contratos de concessão, regidos pela Lei n. 8.987/95 e pela Lei Estadual n. 10.904/93, inclusive os que têm como objeto o transporte urbano de passageiros, que deverão sofrer impactos significativos, por força da expressiva e notória redução da demanda, que decorre da autoquarentena nas principais cidades do país.

Nesses contratos, cumpre ter em conta, também, a própria álea econômica extraordinária que emerge da situação, o que permite, como dito, que o Poder Público realize alterações pontuais em contratos administrativos, examinados caso a caso, e que execute o que se denomina reequilíbrio econômico por fato do príncipe, tratando-se, em suma, de “agravo econômico resultante de medida tomada sob titulação diversa da contratual, isto é, no exercício de outra competência, cujo desempenho vem a ter repercussão direta na econômica contratual estabelecida na avença[1].

Aqui, um ato geral da Administração altera a base fática e normativa em que estava sendo executado o contrato de direito público – de concessão, como no caso –, de ordem a gerar uma situação de onerosidade excessiva em detrimento do contratado no adimplemento de suas obrigações, a qualificar a possibilidade de revisão do contrato, de se proceder ao reequilíbrio econômico-financeiro ou mesmo de responsabilização da Administração, com a rescisão em face do impedimento concreto de se executar o acordo.

Tome-se, por exemplo, tendo o contrato de transporte urbano de passageiros em perspectiva, eventual decreto do Poder Executivo determinando que, mesmo durante o período de autoquarentena ou quarentena impositiva, a frota de ônibus permaneça circulando em idênticas condições às situações de normalidade, o que ensejaria inequívoca perda econômica ao concessionário.

Cabe referir que, nos casos das concessões e das PPPs, torna-se essencial a documentação formalizada desses impactos no curso da execução contratual, sobretudo porque, para o adequado emprego do pedido de reequilíbrio contratual, superado o cenário de pandemia, será analisada a matriz de riscos alocados no instrumento contratual (Lei n. 11.079/2004, art. 4º, VI), de modo que a documentação de eventuais prejuízos e de encargos excepcionais excessivos trará mais segurança ao equacionamento das obrigações ajustadas, e evitará eventual imposição de penalidades, tais como a multa e suspensão de contratar com o Poder Público, por parte dos órgãos de controle.

Diante do exposto, neste momento de crise, sugere-se às empresas que, a respeito dos seus contratos administrativos, adotem as seguintes medidas:

  1. Criação de comitê de crise com os principais gestores e assessores jurídicos da empresa;
  2. Relate ao Poder Público, por meio de correspondências rotineiras, todos os fatos que de alguma forma venham impactando a execução contratual e o seu reequilíbrio financeiro;
  3. Nas correspondências, numerar a comunicação, indicando, no título, “Crise Covid-19”;
  4. Indicar prazo de resposta, fazendo a ressalva de que o silêncio importará em anuência tácita com os requerimentos eventualmente formulados na comunicação.

A equipe do A&PA está à disposição para ajudar no que for necessário e, em caso de dúvidas, esclarecê-las, seja por telefone ou e-mail.

Atenciosamente,

Edinaldo Amaral –                 (81) 9.8869.0508 – edinaldo@aepa.adv.br

Luiz Filipe Figueirêdo –        (81) 9.9187.1115 – luiz.filipe@aepa.adv.br

Luisa Santana –                    (81) 9.9601.7601 – luisa@aepa.adv.br

[1]             MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo, Malheiros, 2009.

Reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos com o poder público e a crise da Covid-19
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